Em 2020, de acordo com dados da Globocan, estima-se que, em Portugal, cerca de 7 % do total de novos diagnósticos de cancro da mama tenha ocorrido abaixo dos 40 anos. Pode parecer uma percentagem pequena, porém, o impacto causado nesta fase da vida da mulher, próspera de planos e projetos para o futuro, faz com que “tudo” seja colocado em perspetiva. Neste sentido, a Dr.ª Mónica Mariano, do Instituto Português de Oncologia (IPO) de Coimbra, partilhou as principais preocupações das jovens mulheres com cancro da mama e como se pode desmistificar. Leia o artigo da especialista.
O diagnóstico de cancro da mama surge sempre de forma inesperada na vida de uma mulher, porém, quando esta doença afeta mulheres jovens, os sentimentos de incerteza tomam proporções gigantescas. O medo é uma das grandes emoções que assola estas sobreviventes daí ser essencial enquanto clínicos estabelecer uma relação médico-doente empática e disponível. Enquanto clínicos, devemos formar e transmitir confiança na Medicina e na evolução da Ciência aplicada aos tratamentos oncológicos atuais. Esclarecer que, embora a agressividade dos tumores possa ser maior nesta faixa etária, em fases iniciais da doença, as taxas de cura de cancro da mama são, felizmente, bastante elevada. E não esquecer de aliar desde o início do seguimento médico o acompanhamento por Psico-Oncologia da jovem e da sua rede familiar mais próxima como facilitador do processo de aceitação e ajustamento à nova fase de vida.
Depois do cancro, a maternidade é uma inquietação relevante. O seu adiamento, frequente na sociedade atual, leva a que muitas destas jovens ainda não seja mãe aquando do diagnóstico e o receio de poderem não concretizar esta vontade é enorme. Cabe aos especialistas explicar que a toxicidade dos tratamentos de quimioterapia e o longo tempo de tratamento hormonal pode comprometer a fertilidade, mas, dependendo da sua idade ao diagnóstico, a gravidez espontânea é ainda viável e, acima de tudo, segura. Além disso, a referenciação mais ágil para Centros de Medicina Reprodutiva com acesso a técnicas de Preservação de Fertilidade tem feito aumentar a possibilidade duma gravidez.
A transmissão de risco de cancro aos seus filhos é outra das preocupações mais frequentes das sobreviventes jovens. As guidelines nacionais e internacionais recomendam a realização de teste genético nesta faixa etária, independentemente da sua história familiar, para excluir a presença de um síndrome hereditário associado. Este teste deve ser oferecido o mais cedo possível após o diagnóstico para poder adequar da melhor forma a estratégia de tratamento e proporcionar aconselhamento genético aos familiares.
A vida afetiva e a sexualidade são altamente afetadas e devem ser delicadamente abordadas. O cancro da mama, ao afetar um órgão tão diretamente relacionado com a feminilidade cursa inevitavelmente com problemas de auto-imagem, auto-estima e intimidade. A menopausa induzida pelos tratamentos sistémicos, e em particular a hormonoterapia, associa-se a uma diminuição do prazer e qualidade das relações sexuais mas o apoio de consultas especializadas em Onco-Sexologia é cada vez mais uma realidade e deve ser possibilitado quem o pretenda. Encontrar formas de diálogo aberto com o parceiro é também imperativo já que se sabe que a taxa de divórcios destes casais é elevada. Voltar a aceitar o corpo é sempre mais fácil quando se tem quem nos ama a apoiar.
A reintegração no trabalho acarreta também preocupação adicional a estas jovens. Dos tratamentos realizados podem resultar limitações físicas que dificultam o exercício da sua atividade profissional prévia e obrigam a ajustes nem sempre bem planeados. A promoção de exercício físico regular e a adesão a programas de reabilitação funcional deve ser fomentada para tentar minorar o impacto destes aspetos. No entanto, são os problemas mentais como a fadiga, a ansiedade, os problemas de concentração e dificuldade de memória que mais são relatados. Para eliminar a insegurança quanto à manutenção do seu trabalho e o receio de menor possibilidade de progressão na carreira é necessário incentivar ações de esclarecimento e sensibilização das entidades patronais. Só assim se poderá conseguir o melhor equilíbrio entre as necessidades específicas destas mulheres e as necessidades do empregador.